segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Cordilheira Blanca uma paixão a primeira vista


A Cordilheira Blanca fica localizada no Peru, as montanhas, a sua maioria acima de 5 mil metros de altura, ficam situadas em torno da cidade de Huaraz, que recebe durante a temporada, que vai de maio a setembro - sendo que o melhor clima é em junho e julho -, turistas de todos os lugares do mundo.

Huaraz está situada a cerca de 3000 metros do nível do mar, o que já causa um desconforto logo na chegada. A partir da cidade existem dezenas de opções de diversão para todos os gostos, desde os mais tranqüilos até os mais radicais. Escalada em gelo, trekking, mountain bike, escalada em rocha.. Mas o que predomina na região é a escalada em alta montanha. Estivemos durante dois meses na região de Huaraz e tivemos a oportunidade de tentar a subida de seis montanhas, tendo êxito em quatro delas. A aclimatação é o que mais influencia, principalmente para os brasileiros que estão acostumados mesmo é com praia e sol.


A nossa “barca” estava composta por três meninas, brasileiras, o que causava muito estranhamento entre os outros escaladores. A Andréia (Soares, 30, Floripa) e a Luana (Hudler, 36, Joinville) já haviam estado na Cordilheira Branca em 2008, e eu estava estreando na neve.

Aclimatação e escalada em rocha

A primeira tentativa foi o Maparaju, uma montanha classificada como fácil, porém não muito visitada, com o cume a 5.326m de altitude. Uma ótima tentativa, que valeu muito como experiência, já que tive a oportunidade de sentir todos os efeitos do mal de altitude. A Andréia e a Luana estavam melhores e saíram para tentar o cume, mas desistiram na entrada do glaciar devido à lentidão e o cansaço, causados pela falta de aclimatação.

A segunda investida na montanha foi na Quebrada Llaca. O plano desta vez era aclimatar escalando durante dois dias em rocha, no acampamento base, e depois subir para o acampamento moraina do Vallunaraju, montanha de 5675m de altitude. Como o acampamento moraina fica perto do glaciar, a cerca de 5000m de altitude, foi possível realizar durante três dias práticas de técnicas de caminhada em glaciar, sistema de resgate em greta e até escalada em gelo. No terceiro dia estávamos tão cansadas e esgotadas de permanecer tanto tempo a 5 mil metros que desistimos de tentar a subida ao cume.

De volta a Huaraz tiramos férias dos nevados e fomos escalar em rocha em Hatun Machay, um sitio de escalada deportiva localizada na Cordilheira Negra, há cerca de 60km de Huaraz e a 4300m de altitude. Puro desfrute, com vias bem protegidas, sol quente, céu azul e tudo isso ao seu alcance caminhando apenas quinze minutos. Depois de sete dias de escalada em Hatun todas conseguiram evoluir um pouco, ganhar mais confiança e finalmente se aclimatar a altitude. O próximo destino era a Esfinge.

A Esfinge é uma montanha de granito com vias de até 750m, seu cume está a 5325m de altitude, localizada na Quebrada Paron. Um grande desafio para nós três, destes de tirar o sono e causar ataques na geladeira, se tivéssemos uma, é claro. Chegado o dia D, acordamos às 5 da manhã, caminhamos até a base da via e com as primeiras luzes do dia começamos a escalada. O plano era no primeiro dia escalar até o grande platô, ao todo 9 cordadas, passar a noite por ali mesmo e no outro dia escalar as 10 cordadas restantes, trecho, que segundo informações, era mais fácil tecnicamente, porém, mais exposto e de difícil orientação. Fomos bem até a quinta cordada, pelo menos era a sensação de quem estava guiando. Porém, quem escalava de segundo sofria com as duas mochilas pesadas, que carregavam sacos de dormir, jaquetas de plumas e muita comida e água. Mulheres sempre prevenidas, tínhamos tudo nas mochilas. Como a escalada seguia lenta e as mochilas cada vez mais pesadas, decidimos descer. E pudemos ver um lindo por do sol quentinhas e confortáveis em nosso acampamento. Como consolo o tempo fechou e nevou durante a noite, foi bom estar na barraca e não no platô. A Esfinge continua lá, e a gana de voltar ainda vibra por aqui.

Cumes Nevados

De volta a Huaraz, pisco e conchitas no Vagamundo e preparação para a próxima empreita. Depois de muito discutir, conseguimos ir as três novamente para a Quebrada Ishinca, local de acesso para a escalada dos nevados Urus, Ishinca e Tocllaraju. A Luana fez duas tentativas ao Tocllaraju com expedições distintas, mas o tempo não estava favorável. Eu e a Andréia fomos para o Urus e o Ishinca. No Urus começamos a caminhar na moraina as quatro da madrugada, a Andréia não se sentiu bem e desceu. Continuei sozinha, bom, difícil estar sozinha nestas montanhas, mas digamos que segui subindo sem as minhas “amiguinhas”. Cheguei ao cume as oito da manhã, e às dez já estava de volta ao acampamento, o tempo estava lindo, céu despejado e sem vento.

Na madrugada marcada para a subida do Ishinca o tempo começou a cambiar, ventava forte. Mesmo assim seguimos com o nosso plano, eu e a Andréia iniciamos a caminhada às quatro da madrugada e às dez da manhã estávamos no cume, permanecemos ali trinta segundos, pois o tempo estava cada vez pior. Finalmente depois de tomar muita surra na Cordilheira Branca fomos presenteadas com uma escalada bem sucedida e lindas fotos de cume.
Alguns dias em Huaraz para reabastecer as energias. E aqui a nossa “barca” se separa. A Andréia, nossa mestre em ecologia, volta para trabalhar, porque alguém tem que trabalhar né? A Luana realiza um sonho e vai escalar o Alpamayo, feito que ela vai contar aqui, pois merece um relato da própria. E eu fico em Huaraz esperando a Luana para seguirmos com os nossos projetos. Cinco dias depois a Luana volta e nós duas seguimos para tentar o Pisco, na Quebrada Llaganuco, onde também estão localizados os acampamentos base do Chopiqualqui e do Yanapacha.


Fizemos a ascensão ao Pisco, 5752m, em três dias. No primeiro fomos até o acampamento base. No segundo fomos até o acampamento moraina e na madrugada saímos para o ataque. Entramos no glaciar às quatro da manhã, às oito estávamos no cume e às dez da manhã comendo macarrão já de volta ao acampamento moraina. Descansamos um pouco e já iniciamos a descida ao acampamento base. Pachamama nos presenteou com um lindo amanhecer, clima perfeito e um visual incrível, do cume do Pisco se pode ver o Artesonraju, o Alpamayo, o Quitaraju, o Chacaraju e até a Esfinge, que continua esperando por nós.

A última empreita foi o Vallunaraju, afinal já havíamos estado lá, já conhecíamos a entrada no glaciar e é uma montanha próxima de Huaraz, com fácil acesso. Em dois dias conseguimos fazer toda a correria. Saímos de Huaraz por volta do meio dia, chegamos ao acampamento moraina por volta das quatro da tarde, com bastante tempo para descansar e comer. Na madrugada, por volta das cinco da manhã, iniciamos a subida ao cume. A montanha, apesar de ser tecnicamente fácil, é muito impressionante, com gretas, pontes e blocos de gelo e uma linda cornisa para se chegar ao cume. Por volta das nove da manhã estávamos no cume apreciando o Huascarán e o Chopicalqui no horizonte. E no fim do dia em Huaraz, de volta ao pisco e as conchitas.

Foram sessenta dias de Cordilheira Branca e não vejo a hora de voltar. Sei que minhas parceiras sentem o mesmo. A grandiosidade do lugar assusta, encanta e apaixona. Os desafios, os medos, as vitórias, a superação, a amizade e o aprendizado foram intensos durante esta temporada. Estivemos sempre escalando em cordadas femininas, não usamos porteadores nem guias. As montanhas que subimos são tecnicamente acessíveis e bem freqüentadas, porém exige preparo físico, uma boa aclimatação e muita gana.


Por Danielle Pinto